Discussão acadêmica sobre liberdade (8º ano)
Caros Alunos,
Segue o texto completo que li para elaborar as aulas sobre liberdade neste bimestre, bem como o link e o crédito aos autores.
É um publicação acadêmica longa para os padrões do ensino fundamental.
LIBERDADE:
DOS PENSADORES AO DIREITO FUNDAMENTAL
Bianca Machado Mendonça
Sumário: 1. Introdução. 2. Breves comentários a respeito dos direitos
fundamentais. 3. Os dispositivos constitucionais direcionados ao direito
à liberdade. 4. Conclusão. Referências.
1
INTRODUÇÃO
A liberdade é um tema que comporta diversas discussões. Seu
valor para os indivíduos acarreta debates arrebatadores entre aqueles que se
opõe quanto ao entendimento sobre o assunto. Com isso, inúmeros são os
conceitos e teses abordados pelos autores[1].
A compreensão do termo varia de acordo com a cultura, com a política, com a
religião e claro com a época de que se trata. Mas não são somente estes fatores
que afetam a concepção e a dimensão que deve se dar a liberdade. Acontecimentos
históricos também alteram a idéia do que seria a liberdade e qual seria a sua
real extensão.
A liberdade dos indivíduos é um assunto que vem sendo
estudado a séculos suficientes para se perder de vista. E a partir desta
conclusão, imperioso abordar a opinião dos grandes filósofos a respeito da
liberdade, posto que ninguém melhor do que estes seres humanos tão reflexivos
para demonstrar a amplitude do termo analisado e a influência do momento
histórico para a concepção do termo.
Um dos primeiros filósofos a aclarar o conceito de
liberdade foi Sócrates (469 a
399 a .c.).
Um dos seus maiores legados refere-se à frase: “conhece-te a ti mesmo”. Deste
princípio retira-se a inteligência de Sócrates sobre a liberdade. Para o
filósofo, o homem livre é aquele que consegue dominar seus sentimentos, seus
pensamentos, a si próprio. E a escravidão é marcada pelo fato do homem deixar
que as paixões o controle. A palavra-chave para a concretização da liberdade,
segundo este pensador, é autodomínio (CHAUI, 1995).
Discípulo de Sócrates, Platão (428 a 347 a .c.) estabeleceu
igualmente seu parecer a respeito da liberdade. Importante se faz explicar que,
para o filósofo citado, a alma do homem é a parte pura do ser humano e seu
corpo/carne é a parte infestada pelas vicissitudes terrestres. Portanto, a
morte teria como conseqüência a libertação da alma. A partir deste pensamento e
de diversos outros, observa-se que Platão entende por liberdade a opção de cada
indivíduo em viver na virtude, em consonância com a moral ou não (CHAUI, 1995).
Encerrando os filósofos da antiguidade, Aristóteles (384 a 322 a .c.) compreende a
liberdade como a capacidade do homem em optar entre as diversas alternativas
que a vida lhe oferece, ou seja, o homem para ser livre precisa ser hábil a
escolher entre as opções que lhe são oferecidas. Inclusive, esta eleição deve
ser feita de maneira voluntária e racional. Verifica-se que a liberdade de
escolher de Aristóteles somente se torna possível aos seres humanos, posto que
necessita de mais do que paixões para norteá-la, distinguindo-o assim dos
demais seres vivos (ARISTÓTELES, 1987).
Seguindo os passos de Aristóteles, Thomas Hobbes (1588 a 1679) concorda com a
conceituação do filósofo, contudo acredita que a escolha entre as inúmeras
possibilidades não é incondicionada, devendo ser observada a probabilidade de
realizá-la. Afirma ainda que
Por
liberdade entende-se, conforme a significação própria da palavra, a ausência de
impedimentos externos, impedimentos que muitas vezes tiram parte do poder que
cada um tem de fazer o que quer, mas não podem obstar a que use o poder que lhe
resta, conforme o que seu julgamento e razão lhe ditarem (HOBBES, 1983, p.78).
Já o filósofo John Locke (1632 a 1704), criador da
expressão “onde não há lei não há liberdade”, diferencia a liberdade natural da
civil, explicando que a natural “consiste em estar livre de qualquer poder
superior sobre a Terra e em não estar submetido à vontade ou à autoridade
legislativa do homem, mas ter por regra apenas a lei da natureza” e a civil
“consiste em não estar submetido a nenhum outro poder legislativo senão àquele
estabelecido no corpo político mediante consentimento, nem sob o domínio de
qualquer vontade ou sob a restrição de qualquer lei afora as que promulgarem o
legislativo” ( LOCKE, 1998, p.401-402).
Por fim, importante aludir o pensamento de Jean Jacques
Rousseau (1712 a
1778). O mencionado filósofo compreende que a liberdade e a igualdade consistem
no escopo de uma legislação, sendo considerado o seu maior bem. Rousseau (1999,
p. 46) aclama em sua obra - Do Contrato Social – que “renunciar à liberdade é
renunciar à qualidade de homem” e que uma vez perdida não poderá jamais ser
readquirida, e desta forma, demonstra que, ao seu entender, a liberdade se
perfaz como imprescindível à sobrevivência dos seres humanos.
Evidente, portanto, que toda esta preocupação em conceber o
significado da palavra liberdade demonstra a sua essencialidade aos seres
humanos, corroborando o alegado inicialmente de que cada indivíduo tem uma
concepção distinta dos demais sobre a
liberdade e sua grandeza, e que cada ser é influenciado por diferentes fatores.
Atualmente, a liberdade em todos os seus aspectos possui relevância tamanha e
diferenciada entre as diversas nações, sendo inclusive, consagrada como um
direito fundamental dos homens. Destarte, não se pode negar a seriedade do tema
que sofreu e continua sofrendo contornos e mudanças constantes.
2 BREVES COMENTÁRIOS A RESPEITO DOS
DIREITOS FUNDAMENTAIS
É cediça a importância
jurídica dos direitos tidos como fundamentais, sobretudo pelo fato de serem
direitos amparados pela Constituição Federal, diploma legal supremo, a qual
todas as outras normas internas devem acatar seus valores e mandamentos e
buscar orientação. Sendo assim, é fácil perceber que os direitos humanos abrangem
àqueles direitos aos quais sem sua compleição, a vivência social dos sujeitos
integrantes das sociedades se torna no mínimo difícil quando não impossível.
Definindo os direitos
fundamentais, José Afonso da Silva (2005, p.178) elucida que
além de referir-se a princípios que resumem a
concepção do mundo e informam a ideologia política de cada ordenamento
jurídico, é reservada para designar, no nível do direito positivo, aquelas
prerrogativas e instituições que ele concretiza em garantias de uma convivência
digna, livre e igual de todas as pessoas.
Estes direitos são considerados básicos e necessários à
convivência harmoniosa e pacífica de todos os indivíduos e são arraigados dos
valores das sociedades. Nas palavras de Fábio Comparato (2007, p.58) “Trata-se,
afinal, de algo que é inerente à própria condição humana, sem ligação com
particularidades determinadas de indivíduos ou grupos”, portanto, percebe-se
que estes direitos independem das diferenças culturais, religiosas, políticas,
sociais e de quaisquer outros aspectos, posto pertencerem a todos os indivíduos
igualmente e na mesma intensidade, devendo ser garantidos para assegurar a
condição das pessoas como seres humanos.
Entende o doutrinador supramencionado que os princípios
fundamentais devem ser compreendidos como sendo de duas ordens, em consonância
com os valores éticos contidos ou sua lógica estrutural do conjunto. Em
seguida, enquadra como princípios axiológicos supremos àqueles que versam sobre
os valores defendidos tanto na Revolução Francesa quanto na Declaração
Universal dos Direitos Humanos: liberdade, igualdade e fraternidade (COMPARATO,
2007).
Contudo, antes de
adentrarmos nas questões a serem explanadas sobre estes direitos, necessário
apontar que consagrada parte doutrinária estabelece diferenciação entre os
termos direitos humanos, direitos fundamentais, direitos essenciais e outras
designações, considerando-os distintos sob a alegação de um termo ser mais
abrangente do que o outro ou possuir positivação normativa diferente[2].
Com toda vênia ao entendimento esposado pelos doutrinadores, não se fará tal
distinção neste trabalho, utilizando-os como sinônimos por motivos
metodológicos.
Primeiramente, relevante
elucidar o tratamento destinado a este grupo de direitos. Robert Alexy (2007, p.45-49)
entende que os direitos do homem são marcados por cinco características
combinadas: universais, “a universalidade dos titulares e destinatários”;
morais, “uma norma vale moralmente quando ela, perante cada um que aceita uma
fundamentação racional, pode ser justificada”; preferenciais, “direitos do
homem estão, com isso, em uma relação necessária para com o direito positivo,
que está caracterizada pela prioridade dos direitos do homem”; fundamentais,
“Um interesse ou uma carência é, nesse sentido, fundamental quando sua violação
ou não-satisfação ou significa a morte ou padecimento grave ou acerta o âmbito
nuclear da autonomia” e abstratos, “Isso se mostra mais claramente na
necessidade de sua limitação ou restrição”.
Dentre estes atributos,
ainda há controvérsia no que se refere a sua universalidade, protegida por uns
e atacada por outros. Guilherme Moraes (1997, p.114) defendendo a
universalidade dos direitos fundamentais declara que “O princípio da
universalidade deve ser compreendido como diretriz segundo a qual todas as
pessoas, componentes da comunidade jurídica, são titulares de direitos e estão
submetidas a deveres nela autorizados”.
Os contrários a esta
universalidade mencionam o seu caráter meramente formal, vazio de conteúdo,
acarretando o seu reconhecimento apenas normativamente, todavia não no seu
exercício. Na verdade, não se pode negar que o exercício efetivo dos direitos
fundamentais encontra-se longe de satisfatório para grande parte dos
indivíduos, com maior intensidade nos países subdesenvolvidos como o Brasil.
Entretanto, é necessário o reconhecimento de sua universalidade até mesmo como
uma forma de garantir a aplicabilidade das normas que abarcam estes direitos.
Não obstante, relevante
assinalar um comentário pertinente ao tema do autor Norberto Bobbio (1992,
p.22) quando declara sobre uma certa tendência de alguns doutrinadores em
atribuírem um caráter absoluto aos direitos fundamentais. Sobre a questão aduz
que “vale a pena recordar que, historicamente, a ilusão do fundamento absoluto
de alguns direitos estabelecidos foi um obstáculo à introdução de novos
direitos, total ou parcialmente incompatíveis com aqueles”, logo, necessário
apontar que apesar de sua fundamental importância aos indivíduos, estes
direitos não podem ser considerados absolutos para não gerarem prejuízos ao
invés dos benefícios que lhes são inegáveis.
Note-se que os direitos
fundamentais são de extrema importância para a coletividade, dadas às
características que lhes são inerentes. Não poderia, portanto, ser diferente no
âmbito jurídico, onde possui a mais alta hierarquia por serem protegidos
constitucionalmente, conforme anteriormente aludido. Sobre o tema, Oscar Vieira
(2006, p.47) assevera que “O reconhecimento expresso ou implícito pela
Constituição de um direito fundamental tem como conseqüência colocá-lo no topo
da hierarquia das escolhas públicas. Ou seja, o interesse ou valor por ele
protegido deve prevalecer sobre outros interesses ou valores”.
O grande valor dos direitos
fundamentais do homem pode ainda ser confirmado através de seus principais
caracteres, quais sejam, a inalienabilidade – são direitos intransferíveis,
inegociáveis pelos homens –, a indisponibilidade – o sujeito não pode dispor
destes direitos –, a imprescritibilidade – são direitos sempre exigíveis, não
prescrevem com o passar do tempo – e a irrenunciabilidade –, não podem ser
renunciados pelos indivíduos. Note-se que estes direitos são cravados pelo fato
de ser impraticável ao sujeito intentar se ver privado deles. Em geral, pode-se
afirmar que não existe a possibilidade do indivíduo ter a capacidade de dispor,
vender, renunciar os direitos fundamentais em virtude da necessidade da
proteção do próprio homem.
O citado autor concluiu
posteriormente que
“Há, em nível internacional e nacional, algumas
dimensões dos direitos fundamentais que se conhecem como cláusulas pétreas da
proteção do ser humano, pensadas a partir do resgate histórico do indivíduo
como sujeito de direito, e referentes aos chamados conteúdos essenciais, ou
núcleos intangíveis e irredutíveis dos direitos fundamentais” (VIEIRA, 2006, p.
217).
Sobre tal questão, Ingo
Sarlet (2004, p.392) leciona: “A condição de ‘cláusula pétrea’, aliada ao
postulado da aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais (art. 5°, § 1°,
da CF), constitui justamente elemento caracterizador essencial de sua força
jurídica reforçada na ordem constitucional pátria”. Neste sentido, os direitos
fundamentais são considerados como “cláusulas pétreas” destinadas a assegurar
as garantias basilares dos indivíduos de maior peso dentro do ordenamento
jurídico e, por isso, precisam de uma proteção mais reforçada.
Apesar de não poderem ser
abolidas do texto constitucional, salvo o caso de criação de nova Constituição
por Poder Constituinte Originário, algumas correntes doutrinárias vêm
entendendo que as cláusulas pétreas não devem ser consideradas intocáveis, em
virtude das constantes mudanças comuns e necessárias ao direito. Ademais, estas
regras poderão ser modificadas por procedimento mais elaborado, através de
Emenda Constitucional e legislação infraconstitucional, visando sempre
melhorar, ampliar o texto vigente. Este é um tema ainda bastante debatido,
entretanto, não cabe trazer esta discussão a este trabalho.
As classificações destes
direitos variam de autor para autor. Alguns qualificam os direitos fundamentais
como direitos de primeira, segunda, terceira, quarta e a recentíssima quinta
gerações, referindo-se assim a evolução histórica destes. Seriam os direitos
civis e políticos, os direitos sociais, econômicos e culturais, os direitos
coletivos, difusos meta-individuais, os direitos novos como bioética e os
direitos virtuais, respectivamente. Outras correntes aludem que os direitos
fundamentais serão entendidos como positivos ou negativos. Significa dizer,
segundo esta classificação, que são positivos por dependerem de prestações
Estatal, como exemplo a educação, e negativos por imporem uma não intervenção
Estatal, um não-fazer, como exemplo a liberdade, conforme explica Paulo Bezzera
(2007).
Por fim, para demonstrar o
quão basilar são os direitos humanos, tem-se que o preâmbulo da Constituição
Federal vigente traz a necessidade de proteção dirigida aos direitos
fundamentais – direitos sociais, liberdade, igualdade, justiça e outros –
corroborando a necessidade de garantir a construção de uma sociedade
democrática dotada de valores soberanos asseverando:
Nós, representantes do
povo brasileiro, reunidos em Assembléia
Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático,
destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a
liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça
como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos,
fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional,
com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus,
a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil.
Ainda referente à legislação
mencionada, vê-se que há dedicação de dois títulos para tratar somente dos
princípios fundamentais e dos direitos e garantias fundamentais, salientando
desta forma a essencialidade da disposição de normas que defendam tais
questões. Sendo assim, vale transcrever o artigo 5º da Constituição Federal que
traz a proteção de alguns dos principais direitos analisados: “Todos são iguais
perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito
à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes”.
3
OS DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS DIRECIONADOS AO DIREITO À LIBERDADE
Dentre os direitos humanos
abrangidos constitucionalmente, vê-se a presença constante e vasta do direito à
liberdade. Por ser um termo abrangente que comporta várias espécies, o direito
à liberdade divide-se em diferentes tipos como, por exemplo, a liberdade de
locomoção, de reunião, de associação, de profissão, de iniciativa, de liberdade
sindical, de ação, de culto, crença e organização religiosa, de aprender,
ensinar, pesquisar, divulgar, de informação e de manifestação de pensamentos.
Ressalte-se que, de acordo
com José Afonso da Silva (2005), as normas constitucionais que regem a
liberdade são, em geral, consideradas como de eficácia plena e aplicabilidade
imediata, devido ao fato de conterem normatividade suficiente à concretização
de seu conteúdo. Contudo, algumas das normas são caracterizadas como de
eficácia contida. Significa dizer então que estas regras não são absolutas por
sofrem certas restrições ou condições. Saliente-se que o fato de serem de
eficácia contida não modifica a sua aplicabilidade imediata e eficácia
plena.
Iniciando o estudo dos tipos
de liberdade, primeiramente, há o direito de locomoção que abrange a
possibilidade de circular ou de permanecer em determinado lugar. Este direito
encontra-se protegido no artigo 5º da Constituição brasileira em vigor, em seu
inciso XV, nos seguintes termos: “é livre a locomoção no território nacional em
tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar,
permanecer ou dele sair com seus bens”, bem como em seu inciso LXVIII, dispondo
que “conceder-se-á ‘habeas-corpus’ sempre que alguém sofrer ou se achar
ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por
ilegalidade ou abuso de poder”.
Manoel Gonçalves Ferreira
Filho (2001, p.291) traz uma relevante observação a respeito do referido
direito quando afirma que “A liberdade de locomoção, assim impropriamente
chamada, pois é o direito de ir e vir e também ficar – jus manendi, ambuland, eundi ultro citroque – é a primeira de todas
as liberdades, sendo condição de quase todas as demais”. A partir do pensamento
esposado, percebe-se a importância da liberdade de locomoção, posto que sua
proteção pela constituição como um direito fundamental impede a privação do
direito de ir, vir e permanecer dos indivíduos, consagrando-se um dos tipos de
liberdade de maior apreço para os homens.
Vale ressaltar que o direito
à locomoção não é absoluto. Há possibilidades em que este direito precisará ser
limitado de maneira mais agressiva, por exemplo, no caso de configurado o
estado de defesa ou o estado de sítio. Nestas situações, verifica-se a
restrição ao direito de locomoção em consonância com o artigo 136, § 3º, I, o artigo
137, I e II da Constituição Federal de 1988. Como poderá ocorrer a limitação em
outras circunstâncias mais amenas, por exemplo, quando da aplicação de normas
disciplinadoras da utilização das vias públicas. [3]
Por sua vez, O direito de
reunião vem explicitado também no artigo 5º do diploma supramencionado, em seu
inciso XVI, aludindo que “todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em
locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não
frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas
exigido prévio aviso à autoridade competente”. Do artigo transcrito, vê-se que
o direito de reunião é garantido a todos, porquanto que seguidos determinados
requisitos exigidos pela lei.
Para a caracterização da reunião,
Luiz Araújo e Vidal Nunes Junior (2006, p.164) aduzem que se faz necessária a
presença cumulativa dos sete requisitos abaixo anotados:
a) participação de duas ou mais pessoas; b)
caráter temporário; c) consciência e vontade dos participantes; d) objetivo
próprio e imanente à razão de ser da reunião; e) finalidade lícita, nela
incluindo o caráter pacífico; f) ausência de armas, nas reuniões de caráter
público; g) comunicação da autoridade competente, em caso de utilização de
espaço público.
Já o direito de associação é
reconhecido pela Carta Magna no artigo 5º, do inciso XVII a XXI, in verbis:
XVII - é plena a liberdade de associação para
fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar;
XVIII - a criação de
associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização,
sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento;
XIX - as associações só
poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por
decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trânsito em julgado;
XXI - as entidades
associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para
representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente;
Os supracitados doutrinadores
(2006, p.166) explicam que para a configuração da associação devem-se
apresentar os seguintes elementos conceituais: “a) plurissubjetividade (duas ou
mais pessoas); b) base estatutária; c) permanência; d) fins comuns e lícitos;
e) direção unificante”. Sendo assim, fácil identificar as diferenças deparadas
pelos dois institutos citados (reunião x associação).
Tratando do direito de
profissão, estabelece o inciso XII do artigo 5º da Constituição: “é livre o
exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações
profissionais que a lei estabelecer”. Note-se que a intenção do legislador é no
sentido de não gerar privilégios de profissões, é permitir a livre escolha
desta, garantindo, consequentemente, a aplicabilidade do princípio da livre
iniciativa nos termos do parágrafo único do artigo 170 da Carta que decide: “É
assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica,
independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos
em lei”.
Não obstante, a norma
transcrita pode ser classificada como de eficácia contida por gerar certas
limitações, como exemplo a necessidade do estudante de direito ser admitido em
exame da Ordem dos Advogados do Brasil para exercer a profissão de advocacia.
Neste diapasão, Manoel Gonçalves Ferreira Filho (2001, p.297) explicita que
Apenas admite a Constituição as restrições a
essa liberdade indispensáveis para a salvaguarda do interesse público. De fato,
consente que a lei ordinária imponha ‘qualificações profissionais’. A liberdade
de trabalho, por outro lado, recebe certas limitações, destinadas a proteger o
próprio trabalhador e a sociedade contra abusos. São limitações concernentes às
condições do trabalho, previstas no art. 7º da Constituição.
Cabe salientar que a liberdade
sindical encontra-se igualmente protegida pela Constituição vigente em seu
artigo 8º lecionando que “é livre a associação profissional ou sindical”.
Assim, demonstra-se que o trabalhador não é obrigado a filiar-se a associações
profissionais ou sindicais, posto ser livre para decidir associar-se ou não a
essas entidades profissionais.
No que diz respeito a
liberdade religiosa, é cediço que o Brasil consagrou-se como Estado laico ou
não-confessional. Destarte, não há privilégios ou diferenças no trato das
diversas igrejas existentes no país. O Estado tem o dever de manter-se neutro
com relação a estas. Paulo Jacques (1956, p.340) ensinando sobre a liberdade
religiosa, classifica as formas em que este direito se proclama. Assegura que
as normas que, entre nós, regem o exercício da
‘liberdade religiosa’, são as seguintes: a) liberdade de consciência e crença;
b) livre exercício de culto; c) liberdade de convicção religiosa, filosófica ou
política; d) assistência religiosa às forças armadas e nos estabelecimentos de
internação coletiva; e) secularização dos cemitérios, sem prejuízo dos
cemitérios particulares.
Sobre a liberdade de
consciência e crença, deve-se ter em vista que esta trata das convicções
íntimas dos seres humanos, do entendimento de cada um não manifestado
externamente. Há, contudo quem diferencie a consciência da crença pelo fato de
considerar que por vezes pode-se ter uma consciência aberta, ou seja, livre de
crenças, razão pela qual tanto a consciência quanto a crença precisam de
proteção constitucional (artigo 5º, VI, da Constituição).[4]
Outrossim, a Carta de 1988
consagra o livre exercício de culto. E esta liberdade, segundo Celso Ribeiro
Bastos (2001), veio para garantir que o culto seja exercido em qualquer local,
não precisando ser manifestado apenas em templos. Destarte ,
o culto importa na exteriorização das crenças, da religião, através de rituais
e outras maneiras de expressão. Ressalte-se que a Constituição anterior previa
a necessidade deste exercício não contrariar a ordem pública e os bons
costumes, todavia o Texto Maior vigente omitiu tal regra. Muito embora esta
omissão atual, tem-se entendido pela necessidade de se observar o requisito
mencionado em virtude dos valores e interesses abarcados pelo próprio sistema
jurídico que impõe a interpretação das normas de maneira a compreender o texto
como um todo e não individualmente.
Relevante observar o
disposto no artigo 5º, inciso VIII da Constituição quando declara: “ninguém
será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção
filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a
todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei”. É a
conhecida escusa de consciência. Conforme explica Celso Ribeiro Bastos (2001,
p.200)
é o direito reconhecido ao objetor de não
prestar serviço militar nem de engajar-se no caso de convocação para a guerra,
sob o fundamento de que a atividade marcial fere suas convicções religiosas ou
filosóficas. É verdade que o Texto fala em ‘eximir-se de obrigação legal a
todos imposta’ e não especificamente em “serviço militar”. É fácil
verificar-se, contudo, que a hipótese ampla e genérica do Texto dificilmente se
concretizará em outras situações senão naquelas relacionadas com os deveres
marciais do cidadão. A experiência de outros países também confirma esse
fato.
Por fim, com relação à
assistência religiosa, o artigo 5º, inciso VII, da Carta Magna define que “é
assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas
entidades civis e militares de internação coletiva”. Com isso, tem-se que
aqueles enfermos internados em estabelecimentos coletivos dispõem da faculdade
de obter a prestação religiosa, qualquer que seja. No entendimento de Alexandre
de Moraes (2008), a intenção do legislador gira em torno de fornecer maior
amparo espiritual aos que se encontram longe de seus familiares e do convívio
social. Acertada a previsão legal, posto que procura garantir melhoras na
qualidade de vida dos indivíduos que se encontram em uma situação de certa
forma degradante e sofrida.
A Carta de 1988 também prevê
o direito de ação que se encontra intimamente ligado ao princípio da
legalidade. Segundo o inciso II do artigo 5º da legislação citada, “ninguém
será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”,
ou seja, trata da liberdade de agir em consonância com as suas convicções e
vontades desde que de acordo com os valores e interesses constantes no
ordenamento jurídico e que não haja proibição legal a respeito.
De modo similar, o inciso IX
do artigo 5º da Constituição brasileira determina: “é livre a expressão da
atividade intelectual, artística, científica e de comunicação,
independentemente de censura ou licença” e no artigo 220, caput,
preleciona: “a manifestação de pensamento, sob qualquer forma, processo ou
veiculação, não sofrerá qualquer restrição, observando o disposto nesta
Constituição, vedada qualquer forma de censura de natureza política, ideológica
e artística”.
Sendo assim, alude Pedro Lenza (2008, p.602):
“Veda-se a censura de natureza política, ideológica artística (art. 220, § 2º),[5]
porém apesar da liberdade de expressão acima garantida, lei federal deverá
regular as diversões e espetáculos públicos”. E no artigo 206, inciso II
dispõe: “O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: liberdade
de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber”.
Conclui-se que o direto à
liberdade é bastante amplo, posto que o termo liberdade compreende inúmeros
direitos dos indivíduos ligados a si, conforme restou demonstrado e, por isso,
vem expresso na Constituição Federal em numerosos artigos que a protegem a
liberdade nas suas diversas formas, contribuindo para a fixação da sua
relevância tanto social quanto jurídica.
4
CONCLUSÃO
Este assunto, a liberdade
dos indivíduos, com absoluta certeza, envolve inúmeras controvérsias, se
consagrando como um assunto bastante discutível ao longo dos anos e que enseja
até os tempos atuais debates apaixonantes, principalmente, pela quantidade de
pontos de vistas diferenciados a respeito do significado do direito à
liberdade. Outra divergência permanente sobre este direito se dá pelo fato de
as pessoas identificarem de maneira distinta qual a dimensão abrangida por este
direito à liberdade, devido a generalidade e amplitude do seu sentido.
A história dos povos
demonstra que a liberdade sempre foi defendida pelas comunidades de forma
veemente. Um exemplo que ratifica a sua importância é o fato de ter feito parte
do famoso trinômio defendido vigorosamente durante a Revolução Francesa
iniciada no ano de 1789: liberdade, igualdade e fraternidade. Pois bem. É
sabido que a liberdade é um direito fundamental garantido constitucionalmente a
todos os integrantes da sociedade e, no caso do Brasil, este direito é
garantido também aos estrangeiros, com as devidas ressalvas. Portanto, não se
pode negar a essencialidade deste direito para a concretização do convívio
sadio dos seres humanos.
Inclusive, vale mencionar
que o direito à liberdade por ser bastante amplo pode ser considerado como
gênero, abrangendo, assim diversas espécies que comprovam sua grandeza, tais
como: liberdade de religião, crença e culto, de associação, de exercício de
trabalho ou profissão, de iniciativa, de reunião, de aprender, de ensinar, de pesquisar,
de locomoção, de expressão da atividade intelectual, artística, científica, de
manifestação de pensamento, de informação.
Deste modo, percebe-se,
através dos dispositivos constitucionais direcionados ao direito à liberdade, a
proteção do tema pela legislação brasileira que corrobora a essencialidade
deste direito para a sociedade.
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[1] Neste
sentido, ver André Ramos Tavares (2007).
[2] Neste
sentido, ver Ingo Wolfgang Sarlet (2003).
[3]
Art. 136. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o
Conselho de Defesa Nacional, decretar estado de defesa para preservar ou
prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública
ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou
atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.
I -
a prisão por crime contra o Estado, determinada pelo executor da medida, será
por este comunicada imediatamente ao juiz competente, que a relaxará, se não
for legal, facultado ao preso requerer exame de corpo de delito à autoridade
policial.
Art. 137. O Presidente da
República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa
Nacional, solicitar ao Congresso Nacional autorização para decretar o estado de
sítio nos casos de:
I -
comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a
ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa;
[4]
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
VI - é
inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre
exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos
locais de culto e a suas liturgias.
[5] Art. 220. A
manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer
forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o
disposto nesta Constituição.
§ 2º - É vedada toda e
qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.
Fonte:
www.revistas.unifacs.br/index.php/redu/article/view/513/355
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